Posted: 16 Jul 2015 10:49 AM PDT
Alguns leitores do nosso portal e
alguns alunos do nosso Curso de Redação e
avaliação de redações sugeriram que a coluna semanal de redação trouxesse mais
análises de textos que obtiveram nota máxima nos exames anteriores. Assim,
atendendo a pedidos, nesta semana analisaremos a dissertação-argumentativa da
candidata Giovana Lazzaretti Segat, do Rio Grande do Sul, publicada pelo
portal G1 em maio deste ano. Como
em outras publicações já dissertamos e analisamos a proposta do Enem 2014, que
teve como tema “Publicidade infantil em questão no
Brasil”, não o faremos neste texto.
Abaixo, na íntegra, a redação da
Giovana:
A propaganda é a principal arma das
grandes empresas. Disseminada em todos os meios de comunicação, a ampla
visibilidade publicitária atinge seu principal objetivo: expor um produto e
explicar sua respectiva função. No entanto, essa mesma função é distorcida
por anúncios apelativos, que transformam em sinônimos o prazer e a compra,
atingindo principalmente as crianças.
As habilidades publicitárias são
poderosas. O uso de ídolos infantis, desenhos animados e trilhas sonoras
induzem a criança a relacionar seus gostos a vários produtos. Dessa
maneira, as indústrias acabam compartilhando seus espaços; como exemplo as
bonecas Monster High fazendo propaganda para o fast food Mc Donalds. A falta de
discussão sobre o assunto é evidenciada pelas opiniões distintas dos países. Conforme
a OMS, no Reino Unido há leis que limitam a publicidade para crianças como a
que proíbe parcialmente – em que comerciais são proibidos em certos horários -,
e a que personagens famosos não podem aparecer em propagandas de alimentos
infantis. Já no Brasil há a autorregulamentação, na qual o setor publicitário
cria normas e as acorda com o governo, sem legislação específica.
A relação entre pais, filhos e seu
consumo se torna conflituosa. As crianças perdem a noção do limite, que
lhes é tirada pela mídia quando a mesma reproduz que tudo é possível. Como
forma de solucionar esse conflito, o governo federal pode criar leis rígidas
que restrinjam a publicidade de bens não duráveis para crianças. Além disso, as
escolas poderiam proporcionar oficinas chamadas de “Consumidor Consciente” em
que diferenciam consumo e consumismo, ressaltando a real utilidade e a
durabilidade dos produtos, com a distribuição de cartilhas didáticas
introduzindo os direitos do consumidor. Esse trabalho seria efetivo aliado ao
diálogo com os pais.
Sérgio Buarque de Hollanda constatou
que o brasileiro é suscetível a influências estrangeiras, e a publicidade atual
é a consequência direta da globalização. Por conseguinte é preciso que as
crianças, desde pequenas, saibam diferenciar o útil do fútil, sendo preparados
para analisar informações advindas do exterior no momento em que observarem as
propagandas.
Giovana opta por intitular sua
dissertação-argumentativa com o título “Criança: futuro consumidor”,
algo que pensamos ser incoerente com o tema que é, justamente, a publicidade
infantil. Acreditamos que a criança já é uma consumidora e não o será apenas ao
atingir a adolescência ou a fase adulta, pois já é um público-alvo da
publicidade por meio da propaganda. Obviamente não é ela quem efetua a compra
propriamente dita, já que são os adultos que compram suas roupas, seus
brinquedos, seus alimentos, seus móveis dentre outros itens. Como a banca
corretora do Enem não avalia títulos, pois para a banca elaboradora este é
opcional, essa incoerência não prejudica em nada a nota da redação como um
todo.
Na introdução, a autora
contextualiza o papel da propaganda no mercado consumidor e já coloca a sua
tese ao afirmar que este papel pode ser distorcido por meio de apelação que
fazem com que as pessoas, principalmente as crianças, pensem que comprar é
sinônimo de prazer. Deste modo, a candidata também já se posiciona
contrariamente às propagandas infantis apelativas e inicia o seu
desenvolvimento explicando o que seria, para ela, apelação, recorrendo de modo
adequado à coletânea de textos motivadores: ídolos infantis, desenhos animados
e trilhas sonoras.
Trecho de redação de Giovana Lazzaretti Segati. (Foto: Reprodução/G1) |
A fim de comprovar o seu argumento,
Giovana usa como estratégia argumentativa o exemplo da rede de fast
food Mc Donald´s que utiliza, como brindes e propaganda, brinquedos como
bonecas. A seguir, fazendo alusão ao gráfico da coletânea de textos
motivadores, a autora cita mais um exemplo, agora do Reino Unido, de como neste
país a publicidade infantil é regulamentada – proibição do uso de personagens
famosos e restrição de horários de exibição – e o compara com a situação atual
do Brasil, onde não há leis específicas, apenas normas. Apesar disso, a
candidata deveria ter transcrito, entre parênteses, o significado da sigla OMS
(Organização Mundial da Saúde), pois ela não deveria pressupor que seu leitor
conheça o significado desta sigla.
No segundo parágrafo do
desenvolvimento, Giovana aborda o papel dos pais nesta questão, já que o
consumo pode tornar a relação conflituosa, segundo ela. A autora afirma, em
seguida, que as crianças perdem a noção do limite por meio da mídia, mas nos
perguntamos, como provocação, se as crianças, ao invés de perderem o limite,
ainda não o têm por estarmos, justamente, em processo de formação no qual este
senso de limite está sendo construído com o auxílio da família e da escola. A
partir de que faixa etária podemos dizer que a criança já possui alguma noção
de limite em relação ao consumo?
Neste mesmo parágrafo, a candidata já
lista suas propostas de intervenções sociais, fugindo do modelo clássico de
colocá-las na conclusão, algo possível que em nada prejudica seu domínio do
tipo textual. Giovana sugere três soluções em três âmbitos diferentes: para
ela, o o governo federal deveria formular uma legislação específica para a
publicidade infantil a fim de haver uma restrição para propagandas de bens não
duráveis; já as escolas, segundo a candidata, poderiam criar oficinas e
distribuírem cartilhas didáticas e a família deveria, paralelamente, dialogar
com seus filhos sobre o tema a fim de, na conclusão, ensiná-los a diferenciar o
útil do fútil para serem analistas críticos das propagandas.
Ainda na conclusão, a autora
recorre a uma citação de autoridade, Sérgio Buarque de Hollanda, para dar
início ao fechamento de sua dissertação-argumentativa. Voltando um pouco às
propostas de intervenções sociais, o detalhamento de cada uma delas foi
fundamental para ela obter a máxima pontuação nesta competência.
*CAMILA DALLA POZZA
PEREIRA é graduada e mestranda em Letras/Português pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP). Atualmente trabalha na área da Educação exercendo
funções relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Foi
corretora de redação em importantes universidades públicas. Além disso, também
participou de avaliações e produções de vários materiais didáticos, inclusive
prestando serviço ao Ministério da Educação (MEC).
Postado em:
https://www.infoenem.com.br
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