07/01/2018
Por Margarida Moraes
Os antigos romanos já demonstravam certa
preocupação com o respeito à norma culta do Latim. Sim, essa questão de norma,
culta, coloquial ou vulgar, é antiga. Desde há muito as pessoas escrevem de uma
maneira e falam de outra, desde há muito há diferentes níveis de escolaridade
ou ausência dela, o que afetava (e ainda afeta) o modo como as pessoas fazem
uso do idioma.
Restou-nos, do Latim clássico, inúmeras obras
literárias (teatro, filosofia, poesia…) e obras de referência, como gramáticas,
e esses textos nos fornecem o padrão erudito do idioma, mas a maioria da população
não tinha educação formal e são poucos os documentos que nos informam como o
idioma era usado no cotidiano. Há, entretanto, alguns documentos curiosos, como
algumas “pichações” nas paredes em
Pompeia, cidade próxima a Roma, que foi soterrada pela erupção do Vesúvio. Eis
algumas frases gravadas nas paredes e muros:
- Pecunia non olet. – Dinheiro não fede.
- Lucrum gaudium. – Lucro dá alegria.
- Lucius pinxit. – Lúcio pintou (isto/aqui)
- Suspirium puellarum Celadus thraex. – Celadus, o trácio (nome de um gladiador) faz as moças suspirarem.
Também chegou até os dias de hoje um documento
chamado “Appendix Probi”. Era uma lista contendo a forma correta quanto à ortografia,
seguida daquela ‘errada’, que deveria ser evitada. Eis alguns exemplos:
- 3. Speculum non speclum.
- 4. Masculus non masclus.
- 5. Vetulus non veclus.
- 6. Vitulus non viclus.
- 7. Vernaculus non vernaclus.
- 8. Articulus non articlus.
- 9. Baculus non vaclus.
- 10. Angulus non anglus.
- 111. Oculus non oclus.
- 130. Tabula non tabla.
- (essas ocorrências são semelhantes ao ‘córrego’ que vira ‘corgo’ e à ‘xícara’ que vira ‘xicra’)
- 25. Formica non furmica.
- 58. Umbilicus non imbilicus. (ainda temos ‘umbigo’ e ‘imbigo’ hehe)
- 83. Auris non oricla. (o mesmo ocorre em ‘otoridade’)
- 159. Terrae motus non terrimotium. (fazemos essa aglutinação em ‘vambora’)
- 220. Noviscum non noscum.
- 221. Vobiscum non voscum. ¹ (a numeração aparece no documento latino)
Podemos observar que alguns tipos de desvios
continuam ocorrendo no português atual, como a troca do ‘l’ pelo ‘r’ (e
vice-versa), do ‘b’ pelo ‘v’, a supressão da sílaba posterior à tônica nas
proparoxítonas, transformando a palavra em paroxítona, que é mais facilmente
pronunciada, e a aglutinação de termos criando uma palavra só. Cometemos os
mesmos ‘erros’ que nossos antepassados, o que mostra que há um padrão no modo
como a língua vai se alterando.
E por falar em listas, boa parte das pessoas
costuma fazer lista de resoluções de Ano Novo. Sugiro colocar na sua alguns
itens como:
1. Ler mais (ou ao menos ler alguma
coisa!);
2. Consultar dicionários (e não
espere que o Google ou o editor de texto corrija as palavras por você, mas
aceite que essas ferramentas mostrem que há erros);
3. Treinar a caligrafia (seus
professores merecem e os corretores no vestibular não farão esforço para
decifrar o texto);
4. Escrever mais, afinal a prática
leva à perfeição!
E, ainda falando de listas, tente memorizar esta:
- De repente (não derrepente)
- Por isso (não porisso)
- O que (não oque)
- Com certeza (não concerteza)
- Tinha chegado (não tinha chego)
- Tinha trazido (não tinha trago)
É só uma pequena lista, os equívocos são bastantes
e bem frequentes, mas ao longo deste ano, vamos listar mais aspectos,
curiosidades e dúvidas da “última flor do Lácio”.
Até a próxima!
Margarida Moraes é formada em Letras pela
Universidade de São Paulo (USP).
Postado em:
https://www.infoenem.com.br/norma-culta-coloquial-ou-vulgar-o-antigo-debate-assim-ou-assado/
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